Ontem senti que vou ficar cá para sempre / Yesterday I felt I will stay here forever. Será? :-)
Esta simplicidade no viver conquistou o meu coração. Senti mesmo que o meu lugar é aqui. Haverá outros mais bonitos, ou até, onde tenho mais história, mas sinto-me tão bem aqui. Tudo muito prático e descomplexado. Gosto.
A valorização dos pequenos prazeres da vida por estas bandas dá-me uma paz, uma alegria - o acordar com os passarinhos, um dia de sol, umas flores, um gelado, um churrasco, passear junto ao canal, dar uma volta de bicicleta, os gatos no quintal, fazer piqueniques, andar de patins, fotografar cogumelos, you name it, tudo isto é valorizado por aqui como se fosse a última coca-cola do deserto.
O à-vontade que se respira - fazer churrascos no parque como se estivéssemos no nosso quintal; puxar a mobília da sala cá para fora, se necessário fôr, só para gozar o sol, conversar com o vizinho e beber um copo; optar por sermos nós a limpar e a reparar a nossa casa, sem receio que os outros pensem que somos uns pobretanas ou uns coitados; e quem diz isto, diz levar almoço de casa para o trabalho ou para a Universidade.
E a forma mais pragmática como se lida com as dificuldades? Ai, gosto muito. - Sobretudo, a forma descomplexada com que os mais velhos utilizam andarilhos ou outros facilitadores de locomoção, a forma respeitosa como as pessoas com deficiência são tratadas ( sem olhares de pena e comiseração), a forma como um garoto usa um aparelho exterior na face e se sente confortável socialmente.
Sinto também uma forma de estar mais tranquila e mais positiva de encarar as conjunturas mais adversas e isso faz-me sentir mais segura, mais feliz.
Gosto do bem-estar que resulta da falta de pressão para ter isto e aquilo e mais um par de botas ou vestir/calçar a marca X ou Y. Veja-se o à-vontade com que se compra e vende em segunda-mão, o sucesso do site Marktplaats ou das lojas Kringloper.
Ou da forma como valorizam a poupança - gratis, actie (promoção) e korting (desconto) devem ser das palavras mais apreciadas por aqui.
O respeito pela privacidade de todos e de cada um. Até a minha mãe reparou que ninguém se mete na vida de ninguém. É verdade que os cabeleireiros e as esteticistas fazem mais perguntas, mas nunca as senti como invasivas, e sim, como tentativa de meter conversa ou conhecer um pouco melhor o cliente.
O facto dos vizinhos se cumprimentarem e trocarem palavras cordiais, mesmo quando não sabem os nomes uns dos outros, é algo que me faz sorrir sempre, porque sabe bem, é bom.
Assim como o facto de se cumprimentar sempre o motorista do autocarro ou as pessoas que estejam à espera na paragem.
Sinto mais respeito pelas escolhas individuais de cada um. O à-vontade com que se coloca uma placa junto à campaínha a dizer que aqui mora o Mark e o Johan, ou, tratar com respeito - e não como estúpidas - as mulheres que optam por ser donas de casa (só para dar dois exemplos).
E há um certo lado feminino que me encanta - as lojas de hobbies e trabalhos manuais, as retrosarias, certas revistas como a Daphne's Diary, as feiras de velharias, as lojas de postais feitos à mão, as feiras de tecidos, o aprumo com que se decoram os jardins, os postais para todas as ocasiões que encontramos nas papelarias...
Também acho piada à forma como se partilha com a vizinhança marcos importantes da nossa vida - a cegonha no jardim porque nasceu uma criança, a mochila e a bandeira nacional porque o (a) filho (a) se diplomou, os bonecos gigantes insufláveis no jardim quando se completa 50 anos,...
E aprecio muito como valorizam a História do país - Gosto de ver as bandeiras hasteadas em cada casa, nos dias 4 e 5 de Maio, ou seja, nos dias em que, respectivamente, se recorda aqueles que morreram na guerra e se festeja a Liberdade. Respeito muito os 2 minutos de silêncio que se fazem às 8 da noite, no dia 4 de Maio, por aqueles que pereceram, sobretudo, na Segunda Guerra Mundial, e acho o concerto no Rio Amstel, em Amesterdão, na noite do dia 5, lindíssimo.
E, apesar dos aspectos menos bons (a humidade no Verão, o frio cortante do Inverno), e dos momentos em que "me passo" (quando levo encontrões na rua sem que me peçam desculpa, ou tenho de pagar uma conta exorbitante relativa a uma despesa de saúde), gosto muito de viver aqui. E é isto. O que o futuro me reserva não sei, mas hoje, aqui e agora, o meu coração está por estas paragens. É este o meu lar, a minha casa (embora não goste das paredes e dos tectos e saiba que, pelo preço desta, em Portugal, compraria uma maior e com outro nível de acabamentos). But you know what I mean...
Cause while i'm here, i'm singing from my heart"
16 comments:
Ainda bem, Sandra!
Porque como dizia o O'Neill, sobre Portugal: "...se fosses só o sal, o sol, o sul..."
Porque isto anda muito tiste por aqui. E não é só do tempo (clima)...
Para mim, é complicado falar sobre estas situações, APS. Sei, por experiência própria, o que são dificuldades económicas (e das sérias). Era uma criança, e depois uma pré-adolescente, quando o FMI esteve em Portugal, nas duas vezes anteriores (tendo a minha mãe ficado viúva em 77). Sei muito bem o que é chegar a dia 21 e não haver dinheiro em casa. E digo isto com muita humildade, para lhe dar uma ideia até onde vai o meu entendimento sobre estas situações.
Vou de férias a PT desde 2008, e desde essa altura, que venho sempre preocupada e triste (a não ser quando faço dias de férias fora de Lisboa; e tem mesmo de ser a bem da minha sanidade mental). Entre 2004 e 2007, confesso que fui perdendo a esperança no país, e daí a saída no final de 2007...
Desculpe o testamento. :-)
Boa noite!
Não é testamento, que é uma coisa final..:-)
Fico grato pelo natural das suas palavras e pela humanidade que há nelas. Nem sempre o diálogo dos blogues é assim.
Desejo-lhe, muito cordialmente, uma boa noite.
Agora fez-me sorrir com o comentário sobre o testamento. Tem razão, tem razão. :-)
Muito grata também pelas suas palavras. :-) Estas situações mexem muito comigo, é só.
Acho que fazes bem - aproveita a nova vida, eu acho que certamente que é melhor do que aqui. Vê lá tu que só ontem a olhar para o Google maps é que notei que Almere fica tão a norte - estás quase ao pé do Pai Natal :)))
Será outra Almere? :-) Esta Almere fica a 25 minutos de Amsterdam, mesmo no centro do país. Estou pertinho de tudo.
Hoje está tão abafado!!! Estou a derreter...
Agora fiquei baralhada - está visto que a geografia não é o meu forte. Aproveita o bom tempo! Bjns!
:-)Esta cidade é a mais jovem da Holanda (38 anos, creio)...
Estas foram muitas das coisas que eu também gostei e aprendi a apreciar quando vivi na Holanda. Cada novo local ensina-nos coisas novas: uma nova maneira de encarar a vida e tanto sobre nós mesmos e o que é importante para nós.
Às vezes questiono-me sobre onde será a "minha casa" mas gosto de pensar que está um pouco espalhada por aí ;-)
Disseste tudo, agora, Ceres.
A tua casa é o teu coração, que vais compondo com a "mobília" adquirida, nos diversos países/locais por onde passas. ;-)
Beijinhos!
Obrigada pelo post, Sandra! e por outros que tens escrito ultimamente sobre a tua experiência na Holanda e porque gosta tanto de viver aqui.
Após este Inverno de 6 meses, ando a precisar de ser recordada sobre o que me encantou na Holanda quando cá cheguei - e as tuas palavras animam-me :)
Ângela, obrigada eu pela tua visita e comentário. É sempre bom escutar o ponto de vista de outros compatriotas. Enriquece-nos muito. Vai aparecendo. Que tal a nova cidade? Estás a gostar? Bjs! :-)
PS: Não te pergunto pela gravidez, pois sei que está a correr muito bem. Tenho lido os teus posts. ;-) Está quase, está quase...:-)
Sim, creio que esta zona foi uma boa escolha embora por vezes sinta falta de viver no centro na cidade ou, pelo menos, de ter um café ou um pub nas redondezas onde ir após o jantar (sem ter que me deslocar até ao centro de Utrecht).
Hoje descobri uma gelataria aqui por perto que está aberta até às 22h, todos os dias da semana - já foi uma pequena vitória ;)
Compreendo-te bem. Na nossa zona, também não cafés, nem restaurantes, nem lojas. É uma área residencial e também sentimos a falta de um cafezinho na rua, nem que fosse só para ir até lá, um bocadinho, distrair. Se quisermos ir a um café ou restaurante - ou simplesmente ver algum movimento -, temos de ir até ao centro de Almere. Ainda bem que há essa gelataria. Ate às 22h, é obra. Aproveitem muito! :-) Tudo a correr bem! Bjs!
Pois, é o problema das zonas residenciais - senão seriam perfeitas!
Mas olha, se um dia quiserem tomar um cafezinho no fim de semana (e associar uma cara ao blog ;) podiamos combinar :)
Bjokas
Obrigada, Ângela, pelo simpático convite. Podes dar-me o teu email? O meu está aí ao lado.
Beijinho! :-)
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