Monday, 28 December 2015

Notas deste Dezembro


Nos dias anteriores ao Natal, fomos, por diversas vezes, aos dois centros de reciclagem local. Geralmente, vamos na Primavera, mas, desta vez, teve mesmo de ser, pois precisávamos de nos libertar de peças de maior porte e volume. Fomos lá deixar o colchão da cama de casal, o armário alto da casa-de-banho, uma fritadeira que raramente utilizámos, a máquina de fazer pão que deixou de funcionar aqui, um velho monitor, um chariot que de desconjuntou, o cesto de metal, peças velhas de madeira, ainda latas de tinta, etc. Foram várias as viagens de carro até lá e em todos elas, para grande espanto meu, não paravam de chegar pessoas com os carros abarrotados de tralha para deitar fora. Parecia que todos queriam começar o Novo Ano bem resolvidos com a vida, deixando no sítio próprio o que já não interessa e ficando assim libertos para novos desafios, de cabeça arrumada, coração sereno e logo, mais felizes. Tinha pensado que por estarmos no Natal e numa estação mais fresca, os centros de reciclagem estivessem mais vazios, mas não. Os carros chegavam uns atrás dos outros: donas-de-casa que vinham sozinhas ou acompanhadas pelas filhas, assim como famílias de 4 e de 5 e que se distribuíam a deixar as tralhas pelos diversos tipos de contentores. Fiquei pasma a olhar para todo aquele movimento e a sentir-me feliz por estar ali e fazer parte dele. Senti-me numa sociedade de pessoas bem resolvidas consigo próprias, conscientes da importância do seu papel no bem estar da comunidade, pragmáticas e activas na resolução dos seus problemas.

E se encontrei muita gente nos centros de reciclagem, numa postura potenciadora de reaproveitamento e reutilização de recursos, o mesmo se passou quando fomos ao Kringloper, entregar o eixo de apoio da cama que tínhamos doado e que tinha ficado para trás. A recepcionista disse-nos para o entregarmos directamente no centro de chegada e recolha das carrinhas/camiões de médio porte. Quando lá chegámos, eram vários e fartos de tudo um pouco. Bem que um dos senhores da recolha nos tinha dito que, ainda nessa tarde, estavam previstas mais 20 casas. Tanto assim que o meu marido acabou por ajudá-los a levar as peças de mobília para a carrinha: duas mesas-de-cabeceira, uma cama e uma cómoda (a nossa mobília de quarto, comprada no IKEA, ainda em Portugal,  e que já havia conhecido várias casas, mudanças e dois países). Seguiram também outras peças, como colchas, almofadões e uma estante e um tampo de secretária demasiado grandes para o espaço que temos. Um dia destes, hei-de passar pela loja do Kringloper, para ver por quanto estão a ser vendidos (se é que já não foram). Primeiro, as peças são recuperadas e só depois colocadas à venda. O que daí resultar reverte para as pessoas carenciadas apoiadas pelo Kringloper. Gosto de toda esta dinâmica, em que nada se perde e tudo se transforma.

Verdade seja dita, que tudo está preparado nesse sentido. Perto de casa, temos também contentores da Humana, onde podemos deixar roupa e calçado. Foi o que fizemos há poucos dias, por diversas vezes, quando levámos os sacos da roupa que me deixou de servir (perdi 10 kg nos últimos meses), alguns lençóis e sapatos muito usados do meu marido.

8 comments:

bea said...

Admiro a perspectiva de nada se perder e tudo se transformar. Mas reconheço-me incapaz de sentimentos tão positivos só por estar a levar para os devidos recipientes as sobras e os trastes de casa. Além do que, em Portugal, que eu saiba, isso nem existe.

Presépio no Canal said...

Bea,

Os sentimentos positivos advêm do facto de também aqui (nos centros de reciclagem) se confirmar o cuidado com o meio ambiente, a organização e a limpeza que se vê por cá e como é elevado o sentimento de responsabilidade individual no bem estar da comunidade. Basta observar, por ex., como são cuidadosos com as suas casas e jardins ( impera o "do it yourself"), se organizam em termos cumunitários (veja-se o caso das equipas voluntárias de vigilância de bairro que nos alertam se encontram alguma coisa vandalizada ou fora de ordem), a forma como o voluntariado está disseminado e como as cidades estão voltadas para os seus habitantes (brevemente, teremos uma equipa a visitar-nos para verificar o isolamento sonoro, por ex.) e o cuidado com o património natural e edificado. Há muita participação cívica em muitas esferas (no ensino do holandês, no apoio às mães expatriadas, aos idosos, etc). Esse cuidado com as pessoas e o meio ambiente, em que todos, de uma forma ou de outra participam, formal ou informalmente, ajuda a criar um sentimento de mais confiança e segurança naqueles que aqui vivem.

Os olhares da Gracinha! said...

Reciclar no sentido de aproveitar para outrem é excelente!
Por aqui vamos renovando...aceitando e dando!
Cada vez msis é importante este gesto se queremos um mundo melhor em todos os sentidos!
Bj amigo

Presépio no Canal said...

Graça,

Concordo inteiramente. Muitas vezes, temos peças boas em casa que não usamos ou estão esquecidas num canto e podem dar muito jeito a outras pessoas (vizinhos, amigos, familiares).
Mas não posso deixar de dizer que a Graça, com a sua imensa criatividade, recicla e aproveita materiais muito bem. É um talento! :-)
Bj amigo

ana said...

Sandra,
É tão bom ver que as pessoas têm tempo para arrumar as suas vidas,ver que têm locais de recolha que tratarão de fazer chegar a outras pessoas aquilo que já não precisam e que a outros irá dar muito jeito.

Por cá há falta de tempo, de organização e planificação. Talvez não tenhamos a falta de espaço que aí se sente, daí se protelar este tipo de tarefas.

Somos diferentes, é uma questão de cultura.
Obrigada por esta partilha.
Feliz Ano Novo!
Beijinhos.:))

Presépio no Canal said...

Ana,

A questão da arrumação é mesmo necessidade, uma vez que a maioria das casas não é muito grande. No nosso caso, por exemplo, não temos varandas, marquises, sótãos, caves ou garagens onde possamos ir deixando as coisas sem nos estarmos a preocupar com isso... Na arrecadação, dá para colocar as bicicletas, o material de jardinagem e de churrasco e pouco mais. Daí o não podermos deixar acumular (não há por onde)...O país é pequeno em território e com 17 milhões de almas, s casas tendem a não ser muito espaçosas...Os centros de reciclagem são mesmo necessários. São o nosso escape. ;-)

Também é giro ver como educam os miúdos nesse sentido (organização e reciclagem). Acho muito piada quando os vejo a acompanhar e a ajudar activamente os pais nos centro de reciclagem, muito concentrados no que estão a fazer :-)) Já para não falar no Dia do Rei quando vão vender os jogos e os livros na rua, com "estratégias de vendas" e tudo, como tocar violino, por ex, para chamar os potenciais compradores...:-))
Isto do comércio está-lhes no sangue. :-))

A organização, como dizes, é muito importante, a nível da família nuclear.
Se pensarmos, sobretudo, nas mães expatriadas que não têm ajudas externas (familiares/ empregadas) e que, às vezes, têm de educar a criança em 3 línguas diferentes (do pai, da mãe e do país)...Ui, ui...

São enquadramentos culturais diferentes, como dizes e bem. :-)

Beijinho, Ana!

Sami said...

Aqui na Australia, apesar de termos mais espaco a nivel das casas, tambem muita gente leva coisas que nao utilisa, mobilias, roupas, etc para lojas (aqui chamadas de op-shops) que ajudam familias carenciadas vendendo esses artigos doados. Ainda antes da minha familia chegar para passar o Natal fui entregar varias coisas a uma dessas lojas perto do meu bairro. Tambem la ja comprei varios artigos interessantes e que reciclo.
E tudo uma questao de cultura - antes de sair de Portugal nem conseguia vender as mobilias ao desbarato, toda a gente quer coisas novas...

Presépio no Canal said...

Sami,

O Kringloper é uma loja desse género. :-)
Gosto muito das suas reciclagens e estou muito curiosa por ver as próximas. :-)
Bom Ano de 2016!!