Wednesday, 28 January 2015

Do frio, das vítimas do holocausto, alguns filmes e um livro


Ontem gostava de ter vindo a este cantinho para relembrar todos aqueles que pereceram no Holocausto, mas a gripe que me fustiga, desde há uma semana, não me deixou. Tem estado muito frio por aqui e há sempre a diferença entre os graus centígrados que o termómetro indica e a temperatura que realmente se sente, à volta de menos 8 graus que o indicado, sobretudo, devido ao vento gélido e cortante que vem do Mar do Norte. E foi ele que, desta vez, voltou a levar-me a melhor. Ele e a minha falta de cabecinha.

Na passada quinta-feira, fui à nossa embaixada, em Haia, tratar, pela primeira vez, do cartão de cidadão e levantar o meu novo passaporte (o anterior estava quase a expirar). Haia é sempre mais fria que Almere, pois "está porta com porta" com o Mar do Norte, mas esqueci-me disso completamente.

Almere estava fria, mas suportável e eu lá fui, no meu casaco comprido azul de lã, camiseiro (sem colete ou pullover!!!), écharpe (e não cachecol) e sem gorro (!!!). Não estava com os copos, não fumei nada esquisito, simplesmente queria vestir um casaco comprido de lã e azul - alguma cor e feminilidade, num país onde a farda diária no Inverno é um kispo preto de penas, se quisermos aguentar os dias ao longo de seis meses. Só queria vestir outra peça de roupa e alguma cor, deixar de me sentir um chouriço por umas horas, e pareceu-me que podia.

Mas não podia, sobretudo, porque me devia ter lembrado que ia chegar mais tarde a casa, uma vez que ia lanchar com uma nossa conterrânea, depois da ida à embaixada. Ela tratou-me muito bem: deu-me chazinho e bolinhos ao lanche e não me deixou ir embora sem uma sopinha quentinha (janta-se cedo por aqui, à volta das seis). Eram 7 horas, quando me despedi e iniciei caminhada até ao centro da cidade para apanhar o eléctrico que me levaria à estação de comboios de Den Haag Holland Spoor. Céus, estava tanto frio!!!

Cheguei a Almere por volta das nove da noite. Vinha quentinha no comboio, mas ao chegar à estação, gelei. Os ossos doeram-me com o frio, só de atravessar o átrio e tremia que nem varas verdes. Saio para a rua, à procura do cavaleiro que me ia salvar e do seu pequeno coche. Não o vejo, volto para dentro do congelador (o átrio) e pensei que era desta que me ia (tenho pouca tolerância ao frio devido ao Hipotiroidismo). Eu a reentrar no átrio, o cavaleiro a chegar, eu a sair novamente do congelador para o Pólo Norte, digo, rua. Nunca me custou tanto um caminho de meio minuto. Foi preciso esperar um tempo, até me recompôr e podermos arrancar.

Vem este intróito a propósito de me lembrar sempre das vítimas do Holocausto, quando me sinto "congelar". Pergunto-me como aguentaram (por dias, semanas, meses,...) o frio gélido e os longos Invernos da Europa Central, sem roupa e calçado minimamente apropriados, sem comida digna desse nome, a dormir em barracões sem condições mínimas de higiene e conforto (um cobertor e não um trapo velho, um duche quente...), já sem falar no medo constante, dos maus tratos, das humilhações, dos trabalhos forçados, do horror vivido e presenciado ao segundo, ao minuto. É inevitável lembrar-me desses bravos, quando me sinto ir abaixo com o frio. E se eu já sofro (e o que sinto nada é, comparativamente...), nem quero imaginar o que eles padeceram naquelas condições (lembro-me sempre das lutas por um par de meias quando morria alguém, já retratadas em filmes...). Nunca deixa de me espantar como ainda houve sobreviventes (ainda se encontrando entre nós 300 almas que viveram naqueles campos de horror e vergonha).

Este é um período da história que me interessa e sobre o qual tenho visto alguns filmes que considero bonitos e interessantes. Hoje, trago aqui dois, mas encontram mais no blogue, sobretudo holandeses.

No ano passado, vi um filme sobre este período que me tocou particularmente. É baseado num livro e, provavelmente, já o conhecem...A Rapariga que Roubava Livros...Deixo aqui algumas imagens, sobretudo para aqueles que ainda não viram....





O segundo, já falei dele aqui, no blogue. Desta feita, holandês, também ele baseado num livro, De Tweeling (As Gémeas), da escritora Tessa de Loo, que se encontra a residir, desde há alguns anos, em Portugal. É a história de duas irmãs, separadas na infância, após a morte dos pais. Uma ficará a viver na Holanda, a outra seguirá para a Alemanha e que, mais tarde, se reencontram e se apaixonam por dois homens em campos opostos da História: um nazi, o outro judeu... 

 


Preparo-me também para começar a ler o livro de Max Hastings sobre Winston Churchill, Os Melhores Anos. Comprei-o em Portugal, quando lá fui em Setembro. Já leram? Gostaram?

Continuação de boa semana para todos!

13 comments:

ana said...

Sandra,
Gostei muito do teu texto.
Vi o filme e li o livro: A Rapariga que roubava livros. Claro, gostei muito.
O que mostras em segundo lugar não vi nem conheço mas vou estar atenta.
Odeio andar enchouriçada em casacos, compreendo, completamente, teres vestido um casaco azul. Às vezes precisamos de nos sentirmos mais femininas.
Que bom teres uma conterrânea para conversar em português.
Beijinho e as melhoras.:))

Margarida Elias said...

Bem vinda, de volta à net, apesar do frio. Em Portugal está menos do que aí, é certo, mas também tem estado frio. Tenho pensado muito nos sem abrigo... Beijinhos!

Presépio no Canal said...

Ana,

O filme De Tweeling já tem alguns anos. Talvez encontres em DVD por aí. Se não encontrares, diz, que vou procurar com legendas em inglês e envio.
Sim, é bom falar em Português :-) e conheço alguns conterrâneos (na minha rua, há vários e também tenho uma amiga em Amsterdam). E às vezes, falo portunhol (amigos espanhóis ou cubanos...:-))
Já estou um pouco melhor. Pelo menos, hoje, já consegui dormir mais umas horas, sem tossir e espirrar desalmadamente.
Beijinhos!! :-)

Presépio no Canal said...

Margarida,
Obrigada. :-) Tenho andado muito afastada da net. Muita coisa para tratar este mês...
A minha mãe tem-me falado do frio por aí e já lhe enviei umas pantufas e botas rasas com pelinho por dentro. A casa da mãe não tem um bom isolamento e não está preparada para temperaturas tão baixas...
Agasalha-te bem. Portugal parece-me mais frio que dantes...
Beijinhos!! :-)

Presépio no Canal said...

E sim, faz muita impressão pensar que há pessoas sem casa e a dormir nas ruas, com estas temperaturas...:-(

Os olhares da Gracinha! said...

Olá amiga...também me deparo com esse problema...uma gripe de quase 2 meses...com duas idas à urgência e que me tem deixado bem prostrada!
Relativamente ao primeiro filme...vi e gostei mas o segundo não conheço!
Bj amigo e as melhoras

Presépio no Canal said...

Querida Graça,

Espero que melhore também rapidamente. O seu sistema imunológico deve estar mais enfraquecido, pois, este período coincidiu com a perda da sua mãe e a Graça foi uma filha extremosa e dedicada e sei bem, por experiência com os meus avós, como é exigente cuidar de idosos, quer do ponto vista físico, quer emocional
(custa muito vê-los, pouco a pouco, perder autonomia, independência e capacidades).
Espero que recupere rapidamente, na medida do possível.
Beijinho grande!

Unknown said...

Boa descricao Sandra :) Espero que agora estejas ja completamente recuperada! Fiquei com curiosidade de ver os filmes, que nao conhecia. E lembrei-me da Lista de Schindler e do Rapaz do Pijama as Riscas, tambem dois livros/filmes alusivos a esse periodo.

Presépio no Canal said...

Olá, Catarina! :-) Com o nariz ferido e um restinho de tosse, mas sim, já recuperada.;-)

Também gosto muito dos filmes que mencionas e já os vi várias vezes. A Lista de Schindler é um dos meus favoritos...Beijinhos. :-)

Sami said...

As melhoras Sandra. De Portugal tambem me falam de bastante frio este ano e a minha filha diz q em Amesterdao tem nevado um pouquinho. Acho que nao estou preparada para passar tanto frio nas minhas ferias, especialmente a sair daqui com imenso calor...

Presépio no Canal said...

Obrigada, Sami. Já estou bem, Graças a Deus. :-)
Sim, aqui também nevou um bocadinho e tem feito muito frio.
É melhor vir preparada, sim. Ainda por cima em Portugal, as casas nem sempre estão preparadas para este frio...Beijinho.

MJ FALCÃO said...

Venho quase um ano atrasada, mas impressionou-me tanto este seu post! Ainda estou arrepiada -não do frio, que não tenho, pois estou de cama com uma horrível crise de 'ciática', mas por tudo o que me fez lembrar a sua sensação de gelo e aquilo que com muita inteligência e sensibilidade lhe associou. São as pequenas coisas que sentimos que nos dão a medida das grandes, do horror, do que nunca vivemos mas fomos capazes -num breve momento- de compreender 'na pele'!
Gostei da forma como escreveu porque vi tudo! desde o seu lindo casaco de lã azul -de que eu gostaria imenso,sei bem!- a tudo o resto. Vi-a tomar o seu chá e bolinhos, a sopa quente e ...de repente o desconforto, o frio, o gelo a que é tão sensível, e vivi consigo este momento de espantoso espanto! Porque tem de ser um espanto enorme sempre! nunca devemos 'habituar-nos' a horror. A todos os horrores, sim, e ao desse Holocausto em especial. Incompreensível, 'espantoso', inominável!
Um beijo por ter escrito o que escreveu...mas a um ano de distância tocou-me muito!Por várias razões. Até porque estive em Trieste (cidade de judeus desde sempre que ficou reduzida em muitos milhares) e, pela primeira vez, apesar de conhecer bem a cidade, entrei no Museu Cívico da Risiera San Sabba que foi um campo de extermínio durante 2 anos creio (1942-44?). Onde foram assassinadas pessoas inocentes e queimadas! sim, tinha um forno crematório (também o fogo não deve ser bom....). Foram mortos ali mais de 700 pessoas -judeus, 'partigiani' italianos, eslavos, croatas...mas sobretudo judeus. Trieste não é como as Polónias e etc mas é uma cidade muito fria, gelada de Inverno quando chega a 'bora' um vento gélido ciclónico. Metiam-nos em mini-celas (cubículos mesmo)cheias e onde esperavam a morte.
Não quero fazê-la sofrer -si que é uma pessoa que sofre com os outros- mas senti-me acompanhada ao ler o seu post.
Bom Natal no seu presépio de luz!

Presépio no Canal said...

Querida MJ,

Eu é que agradeço tão belo comentário. Desconhecia a história de Trieste durante este período tão negro da História da Humanidade. Obrigada por ter partilhado. Aprendi muito ao lê-la.
Agradeço-lhe também as palavras gentis e generosas e espero que fique melhor rapidamente.
Votos também de Bom Natal, nesse coração iluminado que é o seu. :-)
Beijinho!