Naquelas duas noites, tínhamos ficado no hotel mais antigo dos Países Baixos, o Grande Hotel do Dragão (
Grand Hotel De Draak). Lembro-me o quão impressionados ficámos com as traves e vigas de madeira do nosso quarto. O Dragão tinha já mais de 600 anos...
Os corredores, que mais pareciam labirintos, estavam decorados com peças de mobiliário antigo, entre os quais, relógios de pé alto e armários em madeira maciça. Conjuntos em casquinha para sala de jantar podiam ser admirados em vitrines dispostas aqui e ali, em recantos inesperados e ainda desconhecidos para nós. Pratos de cerâmica emolduravam a parede da escadaria principal. Na entrada, o mobiliário clássico adivinhava tempos idos, quase de Renascença, que depois se confirmavam na imponente sala de jantar, em tons quentes, desde as traves do tecto em madeira, aos tecidos vermelhos que forravam as cadeiras.
O Grande Hotel do Dragão tinha a sua casa em Bergen op Zoom. Ali de esquina, ficava a Zelândia e também a Bélgica e com ela a cidade de
Peter Paul Rubens, Antuérpia.
Ao lado do Grand Hotel De Draak, o
Markiezenhof (Palácio dos Marqueses), também conhecido por ser o
Stadspaleis (o Palácio da Cidade) mais antigo dos Países Baixos. O campanário (
Belfry), que me hipnotizou desde a primeira hora como nunca tinha acontecido com nenhum outro, impunha-se, majestoso, também ele, neste magnífico conjunto arquitectónico do
Grote Markt, a praça principal da cidade. Ao contemplar todo o cenário, lembrei-me de uma das cidades mais bonitas da Europa e que fica ali tão perto, a cidade belga de Bruges.
Os sinos, de vez em quando, juntavam-se à festa de risos e conversas nas esplanadas. O coração da cidade batia forte naquela praça. Em cadência, sem sobressaltos, de forma regular e tranquila, mas com pulsar valente.
Nesta cidade católica do Norte Brabante, a devoção à Virgem Maria era visível nas bandeiras azuis que anunciavam a festa de Maria, a
ommegang ou procissão, que tinha lugar em Agosto. Imagens da Virgem com o Menino ao Colo, talhadas em pedra, adornavam certas esquinas e monumentos, como é habitual a sul dos Países Baixos. A religiosidade era visível também na toponímia da cidade. Um exemplo:
Kruisweg / O Caminho da Cruz.
A diversidade das casas contrastava igualmente com as suas congéneres a norte dos grande rios. As cores, a sul, são paletes de pintores: azul suave, branco, cinzento, verde-água, amarelo suave, vermelho escuro. As portas de entrada também ofereciam maior variedade de formatos e padrões e vimos, em algumas ruas, um número considerável de janelas com estores exteriores, tal como é comum em Portugal. Há muito que não via assim tantos estores...
No final da tarde, passeámos pela
Lievevrouwestraat (Rua de Nossa Senhora), que surgia em glória, entre os laranjas crepusculares. Lá ao fundo, o
Gevangenpoort, o monumento mais antigo da cidade
(séc. XIV), que um dia, acolheu prisioneiros e actualmente é possível visitar.
O jantar foi no terraço do restaurante do Grande Hotel do Dragão. Nessa noite cálida de Verão. brindámos, primeiro, com um
Prosecco Eugenio Collavini (a Casa oferecia um aperitivo aos hóspedes se jantassem lá) e depois, já que fazia parte da carta de vinhos do restaurante, com um vinho
branco Esporão Reserva, em homenagem à nossa lua-de-mel, passada em Reguengos de Monsaraz.
Bergen abria-se nos sorrisos de quem nos atendia no restaurante do nosso hotel, de forma quase etérea, sem se fazer pesar - com muita atenção, presença e rapidez de resposta, deixando-nos, depois, em vagar, a gozar o momento. Parecem bailarinos, disse eu ao meu marido.
O Dragão presenteou-nos ainda com outros mimos: desde um croquete redondo (
bitterbal) com mousse de café
, à tábua de diversos pães com azeite, sal e pimenta antes dos pratos principais, às águas naturais e ao café e chás no quarto. Sentimo-nos muito mimados e bem acolhidos. Combinámos, em silêncio, entre os dois, que passaria a ser um dos nossos portos seguros, quando em trânsito ou de férias, por aquelas paragens mais a sul.